Para compreendermos a conduta humana devemos investigar o que
é capaz de causar o mal ou provocar o bem aos membros desta espécie, mesmo que
tais sensações não passem de um mero truque psicológico. O Homem sempre tentou se
aproximar do que lhe agrada e se afastar do que teme. Eis a razão de algumas
mães ainda insistirem em controlar os filhos com histórias como a do “homem do
saco”. Da mesma forma se exerce o poder na esfera científica e política, isto é,
manipulando o conhecimento para garantir benefícios aos “aliados” e o “mármore
do inferno” aos desafetos.
Para escamotear a subjetividade do Direito e da Política,
inventou-se, na seara pública, a ideia de IMPESSOALIDADE dos atos humanos, “garantida”
por mecanismos “eficazes” de obtenção da verdade. Assim, instituiu-se o
PROCESSO, a LICITAÇÃO, o CONSURSO PÚBLICO, o PARECER TÉCNICO, as PROVAS DOS
AUTOS, a PERÍCIA TÉCNICA, a SENTENÇA, etc., como garantia de objetividade. Diante
de tais instrumentos a verdade estaria assegurada no âmbito estatal e banida as
práticas movidas por interesses pessoais.
Desde então, a propaganda oficial tenta convencer a todos –
pelo menos aos despreparados intelectualmente – que esses mecanismos de
obtenção da “realidade objetiva” impediriam a utilização do poder estatal de
forma subjetiva e pessoal, pois a vontade estaria circunscrita a esses
instrumentos e a conduta humana não seria livre. Tudo ocorreria como se o mundo objetivo e o subjetivo
fossem instâncias independentes e sem qualquer comunicação.
Diante desse funesto quadro parece oportuno recorrer a um
filósofo da Ciência para abalizar o nosso raciocínio. Coube ao austríaco Karl Popper desmistificar e
crença da existência de um conhecimento que fosse, de fato, objetivo. A ciência
não teria o condão de produzir a verdade, mas, no máximo, conjecturas que, ao
serem submetidas à comunidade científica, resistissem o mais possível às
tentativas de refutação. Logo, mais científica seria a teoria que resistisse às
criticas que lhe fossem dirigidas pelos outros especialistas. O conhecimento se
desenvolveria, segundo o filósofo, num processo contínuo de erros e acertos –
como o processo de “seleção natural” de Darwin -, em que a hipótese “mais apta”
seria a que melhor resolvesse o problema que se destinou a resolver e que
resistisse a crítica melhor que as hipóteses concorrentes.
Em outras palavras, mesmo no campo científico a verdade não
seria absoluta e objetiva, quiçá no campo administrativo e político. Popper é
fundamental para não engolirmos a conversa de que de que a vontade humana não
participa da produção teórica, seja qual for o campo ou tipo de conhecimento. No Direito, enquanto uma contestável “Ciência
Humana”, não é diferente, faz-se o que bem entende com esse conhecimento.
É nesse contexto que se insere a conduta do Procurador Geral
da República, Roberto Gurgel, de ENGAVETAR, desde 2009, os autos de um Inquérito
Policial que apurou práticas ilegais do senador Demóstenes Torres. Ele reteve os
autos enquanto pode e, somente em 2012, após o fato ganhar publicidade, o endereçou
ao Supremo Tribunal Federal para a propositura da Ação Penal. PROCRASTINAÇÃO PURA!
Mas o PGR negou, de pés juntos, que pretendia beneficiar alguém, foi unicamente
movido (ou petrificado) pela objetividade do conhecimento jurídico que não lhe
deixou alternativa e lhe “obrigou” a engavetar os autos por um largo lapso
temporal. Um caso clássico em que a ciência está a serviço da omissão.
Gurgel agiu como a mãe que usa a história do “homem do saco” para
submeter o filho desobediente. O amedronta quando lhe convém, afinal o seu
poder decorre da história que pode contar. Enquanto pode, Gurgel reteve o IP, pois
é na omissão que reside o caráter torpe do seu poder, pois o uso da violência
simboliza exatamente o contrário: a perda do poder.
Mas para justificar o ato criminoso que praticou, o PGR
utilizou a infantil tese da inexorável defesa da verdade, como se a boa técnica
jurídica o tivesse determinado a reter os autos por anos a fio para melhor
cumprir o seu mister, tentando assim desconstituir a inconteste e flagrante
manipulação que operou para que o senador Demóstenes não fosse oportunamente processado.
Todos (ou quase todos) sabem que no Direito e na Política
TEMPO É OURO.
Mas aqueles que leram Popper sabem que não há conhecimento
objetivo na Ciência - muito menos na política – capaz de submeter o homem e
impedir que beneficie ou prejudique quem lhes convém.
Gurgel, como a maioria dos humanos, não resistiu à tentação
de usar o poder para atingir um propósito pessoal, escondendo-se sob o manto
torpe da ilusória objetividade do conhecimento científico.
Em outras palavras, Gurgel é tão bandido quanto Demóstenes!